Este exemplar do jornal “O Trabalhador Químico”, datado de outubro de 1981, é um fascinante documento histórico que captura a efervescência do movimento sindical brasileiro durante o período final da Ditadura Militar. Como órgão oficial dos sindicatos de trabalhadores químicos e farmacêuticos da região de Campinas (SP), ele vai muito além de um simples boletim informativo, funcionando como uma poderosa ferramenta de mobilização, formação política e construção de identidade de classe.
A manchete principal, “DIA NACIONAL DE LUTA”, ancora o jornal na realidade imediata da luta por direitos. A matéria relata a participação dos trabalhadores da região em um protesto de grande escala, destacando a união de 13 entidades sindicais. A descrição do ato público e a menção a discursos inflamados, como o do líder sindical Jacó Bittar, criticando a política salarial do governo e a “indiferença administrativa da alta cúpula da nação”, revelam um clima de forte oposição ao regime e ao modelo econômico vigente. A linguagem é de combate, convocando os trabalhadores para uma “nova jornada de luta”.
Em paralelo à ação direta, o jornal dedica um espaço nobre à formação ideológica de sua base. O artigo sobre a encíclica “Laborem Exercens”, do Papa João Paulo II, é um exemplo notável disso. Ao analisar um documento papal sobre a dignidade do trabalho, o sindicato busca dialogar com a fé e os valores de muitos trabalhadores, ao mesmo tempo que utiliza os argumentos da própria Igreja para criticar o “capitalismo liberal” e o “coletivismo marxista”, defendendo a primazia do ser humano sobre o capital e o direito fundamental à sindicalização.
Um dos aspectos mais criativos e interessantes da publicação é a seção “Meu personagem é…”. Através de caricaturas como “Zé Justo”, “Zé Inflamável”, “Tidão Fumaça” e “Joaquímico”, o jornal cria arquétipos com os quais o leitor pode se identificar, traduzindo questões do dia a dia da fábrica e da luta sindical para uma linguagem visual, humorística e acessível. A iniciativa de convidar os leitores a escolherem o personagem do jornal (“Ajude o Sindicato a escolher o personagem do ‘Trabalhador Químico'”) é uma estratégia inteligente para engajar a base e fortalecer os laços com a publicação e, por extensão, com o próprio sindicato.
Em suma, este jornal é um retrato de um sindicalismo aguerrido e consciente de seu papel político. Ele demonstra que, mesmo sob um regime autoritário, os trabalhadores se organizavam não apenas para reivindicar melhores salários, mas também para construir uma consciência coletiva, disputar narrativas e se afirmar como uma força social determinante na história do país.